- Um
dos grandes nomes do violão de sete cordas no Brasil hoje, Luís Filipe de Lima
costuma ser procurado nas redes sociais por jovens violonistas atrás de dicas
(“que cordas você usa? Que dedeira? Que sistema de captação?”, detalha ele).
Baseado no aumento dessa demanda, ele já vinha com a impressão de um
crescimento do interesse no instrumento. Mas confirmou mesmo numa dessas
conversas, quando um dos estudantes contou que escolheu tocar o violão de seis
cordas porque “hoje todo mundo está tocando sete cordas, me especializando no
de seis pinta mais trabalho”.
O
relato meio anedótico de Lima aponta um movimento que se dá de forma discreta,
porém contundente — como os desenhos de notas graves do violão de sete. E que
pode ser registrado em diversas frentes, como a onipresença do instrumento nas
rodas de choro (“a formação característica dos regionais é com um violão de
sete e um de seis, hoje você vê muitos grupo sem violão de seis, ou mesmo com
dois de sete”, explica o violonista Rogério Caetano). Ou a série “Sete vidas em
7 cordas”, de Pablo Francischelli, com curadoria e apresentação de Yamandu
Costa, que traça para o Canal Brasil (ainda sem data de estreia) um mapa da
história e do presente do instrumento, de diferentes tradições e gerações,
cobrindo do mestre Valter Silva, de 75 anos, ao pernambucano Vinicius Sarmento,
de 23. Ou a exploração de novas fronteiras como o que Lima tem proposto em
trabalhos de caráter experimental como sua parceria com o guitarrista e
produtor Arto Lindsay e em sua atuação com o grupo Coletivo Samba Noir. Ou
mesmo — e sobretudo — no interesse dos jovens estudantes de música.
Nesses 15 anos
de experiência na Escola Portátil de Música, posso assegurar que a proporção de
alunos de bom nível dedicados ao sete cordas passou de 1/3 dos violonistas para
2/3 — atesta Maurício Carrilho, violonista e coordenador da escola, ressaltando
que lá não há curso específico para sete cordas. — Essa procura desenfreada
pelo sete cordas tem até gerado um problema. Esses meninos querem sair fazendo
frases (as chamadas
“baixarias”, traçadas na região grave, características do instrumento) mas sem o fundamento harmônico e rítmico de quem passou pelo seis
cordas. Ou seja, fazem frases em momentos inoportunos, que acabam criando uma
deformação no fazer do choro e do samba. Por isso não temos o curso de sete
cordas, e sim de violão. Todos têm que estudar harmonia e ritmo (base do violão de seis) e contraponto (fundamento
do violão de sete).
Se por um lado a “procura desenfreada”
pode provocar essas distorções que aponta Carrilho, por outro tem permitido o
desenvolvimento de diversas linguagens — ou sotaques — só possíveis com a
popularização — e até mesmo vulgarização — do instrumento.
Temos o Vinicius em Recife (o músico é próximo da cena MPB-pop-rock contemporânea local, de artistas como Ylana Queiroga, Nação Zumbi, Tibério Azul e Vitor Araújo), o Rogerinho (Caetano), que desenvolveu uma linguagem muito particular, de acordes alterados, entortando harmonicamente — avalia Lima, citando também suas atuais experiências com o eletrônico. — Essa tendência do sete cordas invadir outras praias já vinha de antes, no baião de Luiz Gonzaga, por exemplo. Jackson do Pandeiro também gostava. Já era um desvio de percurso, e agora tem essas várias experimentações, o que é muito positivo por demonstrar a vitalidade do instrumento.
INSTRUMENTO TEM
ORIGENS RUSSAS
Os violonistas destacam algumas
possíveis explicações para o atual momento do instrumento. O próprio
reaquecimento do choro — a partir dos anos 1990 — e o surgimento de escolas
como a Portátil (em 2000), no Rio, e a Escola Brasileira de Choro Raphael
Rabello (1998), em Brasília, plantaram as bases do que se vê agora. Da mesma forma,
o aparecimento na última década de virtuoses como Yamandu e Rogério Caetano —
que gravaram juntos em 2013 um raro álbum de dois sete cordas, o que não deixa
de ser um indicativo também do que temos hoje — fez com que muitos olhos e
ouvidos se voltassem para o instrumento. Outro motivador foi o lançamento de
material didático específico, também a partir da década passada, assim como o
uso da internet como fonte de estudo.
Um desses métodos, “Sete cordas, técnica e estilo”, de Rogério Caetano (com texto, organização e direção de Marco Pereira, violonista que fez nome no seis cordas e hoje se aventura no sete) está sendo relançado agora — a edição original, de 2012, esgotou-se na época. Os dois instrumentistas fazem um workshop na sexta-feira (inscrições pelo telefone 2527-6200) sobre a história da linguagem do instrumento, exposta no livro.
Atravessamos todo esse trajeto, de Dino, passando pelos irmãos Valter e Valdir Silva, por Raphael — explica Rogério Caetano, que crava: — O sete cordas é o principal instrumento popular do Brasil no momento. Por essa possibilidade de ser instrumento de acompanhamento ou solista, por se apoiar no improviso, ou seja, comportar a criatividade constante, ele é apaixonante.
Além de mapear o cenário do instrumento
(com episódios dedicados a Valter Silva, Carlinhos Sete Cordas, Rogério
Caetano, Luizinho Sete Cordas, Vinicius Sarmento e Arthur Bonilla), a série
“Sete vidas em 7 cordas” investiga as origens do instrumento.
— Num dos episódios, Yamandu vai à
Rússia para estudar a história de que o sete cordas foi introduzido na música
brasileira pela geração do Tute e do China (irmão de
Pixinguinha) depois de ter sido visto aqui na mão de ciganos russos — conta o diretor
Pablo Francischelli.
O Globo
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